sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Comissão Nacional da Verdade e os seus 7 membros

Segue abaixo um breve quadro comparado de algumas Comissões de Verdade que se tornaram paradigmas para o estudo da Justiça Transicional. Considerando que apenas agora o Estado brasileiro passa a dar mais importância para este debate, entendemos ser de fundamental importância olhar o exemplo de outros países, que já estão mais adiantados nessa discussão e que tiveram modelos que podem se dizer bem sucedidos.

País  
Nº de membros
Período Investigado
Período médio por membro
Argentina 
13 membros
7 anos  
0,5 ano por membro
Chile 
8 membros
17 anos
2,12 anos por membro
El Salvador
3 membros
12 anos 
4 anos por membro
África do Sul
17 membros
34 anos
2 anos por membro
Brasil 
7 membros
42 anos
6 anos por membro


Como se pode observar, considerando o período estabelecido no art. 1º do recém nomeado PLC 88/11 que tramita no Senado Federal e que cria a Comissão Nacional da Verdade, e o número de membros previsto no art. 2º do referido texto, teremos uma comissão de verdade que contará com um total de 7 membros, responsáveis por investigar 42 anos de violações de direitos humanos no Brasil.

Esta breve análise nos faz ver que estamos lidando com a pior média (tendo em vista que os membros podem não dar conta da demanda de relatos) de trabalho por membro numa Comissão. A Argentina, que teve uma Comissão de Verdade bem sucedida, fica com uma média muito melhor.

É certo que a experiência de transição não pode ser transportada de um país para o outro de maneira tão simples, pois são processos complexos nos quais devem ser observados os diferentes contextos políticos, culturais e sociais em que cada um acontece.  Nem mesmo a comparação entre as diferentes Comissões é tão fácil, visto que a própria Comissão argentina, a CONADEP, não possuiu o mesmo trabalho que se espera da Comissão Nacional da Verdade brasileira. Como se sabe, os argentinos se valeram de processos judiciais para estabelecer responsabilidades individuais, utilizando-se, assim, de diferentes mecanismos de justiça transicional de forma complementar para alcançar a verdade histórica. A Comissão Nacional da Verdade, ao contrário, pretende apontar agentes do Estado que cometeram graves violações de direitos humanos, valendo-se, todavia, da Lei de Anistia - tal como interpretou o STF - para que estes não sejam responsabilizados por tais crimes.

Fica claro que, comparativamente, o período estabelecido por esse Projeto de Lei é grande demais, além de descaracterizar o período em que ocorreu um golpe civil-militar no Brasil - marco inicial de um contexto específico de violações de direitos humanosno país. Se olharmos o período (também largo: de 1960 até 1994) investigado pela comissão da África do Sul, vemos que a Comissão brasileira mereceria um número muito maior de membros para a tarefa - a sul-africana contou com 17 membros. Conforme indica a tabela acima, a quantidade de trabalho por membro na CNV é vertiginosamente maior do que em qualquer outra comissão. A Comissão que mais se aproxima da brasileira nesse quesito é a de El Salvador, que ademais de investigar um período menor em um país menor, é conhecida por ter contato com o auxílio de governos estrangeiros e organismos internacionais na busca e coleta de informações.

As avaliações feitas acima são apenas um esforço no intuito de pensar qual seria o melhor formato para a Comissão Nacional da Verdade. Antes de querer apresentar um formato ideal, o que se busca ao fazer comparações é tentar objetivar a discussão e apresentar critérios claros para as escolhas que estão sendo feitas neste processo, alcançando assim a transparência que se espera do poder público quando está criando um mecanismo que vise a garantia e promoção de direitos. O que a sociedade civil busca, no final das contas, ao clamar por um processo participativo e transparente, é poder saber: houve um estudo para que se chegasse ao número total de 7 membros? Esse é um número viável tão-somente ou é uma escolha aleatória?

Até o momento, não há qualquer esclarecimento ou diálogo sobre o tema. Eis o problema que pode deteriorar toda a confiança que a sociedade deveria ter nesta Comissão; que pode impedir que familiares, ex-presos, vítimas etc. sintam-se reconhecidos como tal, ou seja, como titulares de direitos; e que não colabore para uma reparação integral, tão importante quando se fala de comissões de verdade.

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